Disponibilização: Quarta-feira, 15 de Agosto de 2012
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I
São Paulo, Ano V - Edição 1246
2613
pessoalmente de cada ato fraudulento realizado para dar forma legal a uma contratação realizada sem a observância da lei e
dos princípios da administração pública. Estes têm obrigação de verificar a legalidade de tal procedimento, uma vez que foram
nomeados pelo Prefeito Municipal para a realização de tal mister. É evidente que possuem o dever de verificar a real existência
das empresas que participam de licitação, pois do contrário sequer seria necessária sua nomeação. Precisam verificar não
apenas a regular entrega da documentação, como também sua efetiva existência e autenticidade apta a gerar a contratação
com o poder público municipal. No presente caso toda a documentação apresentada era falsa, o que revela o dolo da conduta.
Os réus responsáveis pelo certame exercem função pública e nessa qualidade lidam com a gestão de recursos públicos que
pertencem a todos os cidadãos de Francisco Morato. Tem o dever de agir com diligência, observando os princípios da moralidade,
legalidade e impessoalidade e não podem pretender se eximir das obrigações que lhes são próprias. Com relação as empresas
e aos réus sócios das empresas também restou comprovada suas responsabilidades, haja vista que todos compactuaram para
a feitura do processo licitatório fraudulento, pois realizaram a obra à municipalidade sem terem participado de licitação, sendo
beneficiados com o contrato firmado sem a exigida concorrência. É flagrante, pois, a infringência aos princípios da legalidade,
publicidade, impessoalidade e moralidade pelo réu. Parte dos réus é agente público nos termos do art. 2o da Lei nº 8.429/92.
Também era no tempo dos fatos e ainda é atualmente o ex-prefeito, eis que exercia, mediante remuneração, mandato eletivo de
Prefeito do Município de Francisco Morato. A Constituição Federal e a lei de improbidade administrativa impõem aos agentes
públicos de qualquer nível ou hierarquia o dever de zelar pela estrita observância dos princípios da legalidade, impessoalidade,
moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhes são afetos. Tais princípios não são meras recomendações aos agentes
públicos, mas verdadeiro dever para com a administração, já que o cargo que exercem possui o objetivo precípuo de atingir
finalidades públicas e jamais interesses pessoais daqueles que ocupam o cargo. Violado foi o princípio da legalidade, basilar do
regime jurídico-administrativo, típico do Estado de Direito, uma vez que os requeridos, infringiram as regras esculpidas pela Lei
n° 8666/93, sendo que, contratou-se empresa para a realização de serviços sem o devido processo licitatório. Ainda forjaram a
realização de tal procedimento, frustrando a licitude do mesmo. Sobre o princípio da legalidade, leia-se: “É em suma: a
consagração da idéia de que a Administração Pública só pode ser exercida na conformidade da lei e que, de conseguinte, a
atividade administrativa é atividade sublegal, infralegal, consistente na expedição de comandos complementares à lei. ...ele é a
tradução jurídica de um propósito político: o de submeter os exercentes do poder em concreto - o administrativo - a um quadro
normativo que embargue favoritismo, perseguições ou desmandos. Pretende-se através da norma geral, abstrata e por isso
mesmo impessoal, a lei, editada pois pelo Poder Legislativo -...- garantir que a atuação do Executivo nada mais seja senão a
concretização desta vontade geral” (Celso A. Bandeira de Mello - Curso de Direito Administrativo, 5a edição, p. 49). Ensina a
Professora Maria Sylvia Zanella di Pietro, em Direito Administrativo: “Legalidade - Este princípio, juntamente com o de controle
da Administração pelo Poder Judiciário, nasceu com o Estado de Direito e constitui uma das principais garantias de respeito aos
direitos individuais. Isto porque a lei, ao mesmo tempo em que os define, estabelece também os limites da atuação administrativa
que tenha por objeto a restrição ao exercício de tais direitos em benefício da coletividade...a vontade da Administração é a que
decorre da lei.” (7a edição, p. 61). No que tange ao princípio da moralidade leciona Hely Lopes Meirelles que: “A moralidade
administrativa está intimamente ligada ao conceito do “bom administrado” que, no dizer de Franco Sobrinho, “é aquele que,
usando de sua competência legal, se determina não só pelos preceitos vigentes, mas também pela moral comum...” E conclui o
renomado autor dizendo “...daí por que o TJSP decidiu, com inegável acerto, que “o controle jurisdicional se restringe ao exame
a legalidade do ato administrativo; mas por legalidade ou legitimidade se entende não só a conformação do ato com a lei, como
também com a moral administrativa e com o interesse coletivo.(in op. Cit. Pg. 85, grifo nosso)” Diante disso, tem-se que a
conduta dos requeridos foi dotada de imoralidade, vez que ficou claro que a realização da licitação fraudulenta foi a maneira que
encontraram para justificar a realização do contrato e o pagamento da empresa sem que houvesse efetivo procedimento
licitatório para julgamento da melhor proposta, com vista no interesse público. Há também imoralidade por parte dos demais
acusados, pois foram beneficiados com o contrato, sem que tivesse participado de licitação. Além disso, ainda que tenha
prestado os serviços ante da contratação a pedido da municipalidade, a violação aos princípios constitucionais esta presente,
pois esta não concorreu com outras empresas também capazes de realizar o serviço. Há no caso também lesão ao princípio da
impessoalidade, pois não houve tratamento igualitário na relação com o poder público, pois todos já estavam conluiados para
que a ré CONSTRUTORA PROCEDIMENTO LTDA. vencesse a licitação. Portanto, é cristalina a lesividade na conduta dos réus.
Comprovada a ilegalidade, a lesividade, a falta de honestidade e a afronta a moralidade nos atos praticados pelos réus, impõese a procedência do pedido, uma vez que a conduta está prevista no artigo 10, incisos XI e XII a artigo 11, inciso I da Lei no
8.429/92, que relaciona os atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao Erário e que atentam contra a
administração pública. Assim, levando-se em consideração as diretrizes do parágrafo único do artigo 12 da Lei nº 8.429/92, bem
como a conduta dos requeridos que exercem função pública e violaram diversos princípios constitucionais que norteiam a
Administração Pública, deverão ser condenados a perda das respectivas funções públicas, suspensão dos direitos políticos por
5 anos, multa civil de dez vez o valor de sua remuneração mensal e proibição de contratar com o Poder Público ou dele receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de três anos. No que tange aos particulares, fazem jus ao recebimento
do valor equivalente ao serviço efetivamente realizado, do qual a municipalidade se beneficiou, para não gerar enriquecimento
indevido. Deverão, todavia, arcar com multa civil equivalente a duas vezes o valor do acréscimo patrimonial obtido e a proibição
de contratar com o poder público. Ante o exposto e pelo mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado
pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO nos autos da ação civil pública movida em face de JOSE APARECIDO
BRESSANE, MILTON NICODEMO, EDNEY GOZZANI, ANTONIO BENEDITO PEREIRA, CONSTRUTORA PROCEDIMENTO
LTDA., OFICINA DE PROJETOS S/C LTDA., HENRIQUE ANDRADE MARTINS e MARCO ANTONIO RODRIGUES MARTINS,
devidamente qualificados nos autos, para CONDENÁ-LOS SOLIDARIAMENTE no seguinte: 1) Declarar nula a licitação, assim
como o contrato realizado entre o Município de Francisco Morato e a empresa CONSTRUTORA PROCEDIMENTO LTDA., sem
determinar a devolução dos valores pagos eis que a obra foi efetivamente realizada, para evitar enriquecimento ilícito do
município. 2) CONDENAR os réu JOSE APARECIDO BRESSANE, MILTON NICODEMO, EDNEY GOZZANI, ANTONIO
BENEDITO PEREIRA pela prática de ato de improbidade administrativa por ato doloso que causa prejuízo ao erário, previstos
nos artigos 10 e 11 da Lei 8429/92 às sanções de: a) perda da função pública exercida; b) suspensão dos direitos políticos pelo
prazo de cinco anos, a contar do trânsito em julgado da decisão; c) pagamento de multa civil equivalente a dez vezes o valor da
remuneração mensal de cada um à época dos fatos e d) proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou
incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio
majoritário, pelo prazo de cinco anos. 3) CONDENAR os réus CONSTRUTORA PROCEDIMENTO LTDA., OFICINA DE
PROJETOS S/C LTDA., HENRIQUE ANDRADE MARTINS e MARCO ANTONIO RODRIGUES MARTINS pela prática de ato de
improbidade administrativa previstos nos artigos 10 e 11 da Lei 8429/92 às sanções de a) pagamento de multa civil no valor de
R$ 297.960,00, equivalente a duas vezes o valor do acréscimo patrimonial obtido ilicitamente, sendo que tal quantia deverá ser
corrigida pela tabela de correção de débitos do E. Tribunal de Justiça de São Paulo e acrescida de juros legais de 1% ao mês
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º