Disponibilização: Terça-feira, 20 de Abril de 2010
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III
São Paulo, Ano III - Edição 696
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instrução processual as partes nada requereram (fls. 147e 148). Em alegações finais o Ministério Público pugnou pela
procedência da ação penal e a consequente condenação do acusado nos moldes preconizados pela denúncia (fls. 218 a 223); a
Defesa, por sua vez, pleiteou a improcedência da ação penal e, desta forma, a absolvição do denunciado (fls. 228 a 233). É o
relatório. Fundamento e decido. Não há preliminares argüidas pelas partes a serem analisadas pelo juízo. No mais, estão
presentes todas as condições da ação e todos os pressupostos processuais. No mérito, a ação penal há de ser julgada
parcialmente procedente. (i) Dos crimes de porte ilegal de arma de fogo de uso restrito e uso permitido (art. 16, § único, IV; e art.
14; ambos da Lei 10.826/03) A materialidade delitiva restou demonstrada pelo laudo pericial de exame em arma de fogo e
munições (fls. 56 a 59). Após a produção de toda a prova em juízo e ao ser interrogado, o acusado confirmou que realmente
transportava uma arma de fogo e que as munições estavam no interior de uma sacola (fls. 137 a 140). A confissão é prova
bastante para o édito condenatório. Isto porque a confissão foi livre e espontânea, sem motivos para ser declarada a nulidade
do ato. Neste sentido já decidiu o extinto Egrégio Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo:Sem margem para
divagações doutrinárias ou construções hermenêuticas, a confissão judicial constitui elemento seguríssimo de convicção.
Apenas especialíssima e incomum circunstância que lhe evidencie a insinceridade justifica sua recusa (TACRIMSP 8ª Câmara
Ap. 470.903 rel. Des. Canguçu de Almeida, j. 08.10.87, v.u.) apud Mohamed Amaro, Código de Processo Penal na Expressão
dos Tribunais, 1ª edição, 2007, Ed. Saraiva, nota ao art. 197, pág. 259).Mas não é só. A prova oral colhida corrobora a confissão
do acusado. Vejamos. Os policiais militares Marcos André de Oliveira e Marcos Danilo da Silva Flores relataram que, em
patrulhamento pelo local dos fatos, abordaram o veículo na qual estava o acusado e lograram encontrar uma arma de fogo,
calibre 38, e munições, cujas posses foram assumidas pelo denunciado (fls. 111 a 119). Deve ser dada toda a credibilidade ao
testemunho dos policiais que efetuaram a prisão em flagrante do acusado, pois são servidores públicos investidos de fé pública.
Ademais, a simples condição de policial sem estar aliada a elementos concretos de suspeição ou impedimento não retira a
eficácia probatória do testemunho prestado. Este o entendimento esposado pelo Supremo Tribunal Federal: O valor do
depoimento testemunhal de servidores policiais - especialmente quando prestado em juízo, sob a garantia do contraditório,
reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não se podendo desqualificá-lo pelo só fato de emanar de agentes estatais
incumbidos, por dever de ofício, da repressão penal. O depoimento testemunhal do agente policial somente não terá valor,
quando se evidenciar que esse servidor do Estado, por revelar interesse particular na investigação penal, age facciosamente ou
quando se demonstra - tal como ocorre com as demais testemunhas - que as suas declarações não encontram suporte e nem se
harmonizam com outros elementos probatórios idôneos. (STF -1ª Turma - HC n0 74.608-0/SP - Rel. Min Celso de Mello - DJU
11/04/97, pág. 12.189). A prova testemunhal obtida por depoimento de agente policial não se desclassifica tão-só pela sua
condição profissional, na suposição de que tende a demonstrar a validade do trabalho realizado; é preciso evidenciar que ele
tenha interesse particular na investigação ou, tal como ocorre com as demais testemunhas, que suas declarações não se
harmonizem com outras provas idôneas (Supremo Tribunal Federal, HABEAS CORPUS Nº 74522 JULGAMENTO: 19/11/1996).
Outrossim, a própria namorada do acusado, sra. Ângela Aparecida Cardoso, relatou que o denunciado tinha arma de fogo que
não lhe pertencia (fls. 134 a 136). Já as demais testemunhas de Defesa não presenciaram os fatos narrados na exordial o que
não tem o condão de infirmar a prova acusatória coligida em juízo (fls. 120 a 133). Ao contrário do que assevera o douto
Defensor, a arma de fogo desmuniciada não retira a tipicidade do fato criminoso porque o tipo penal do art. 16 da Lei 10.826/03
não exige que a arma de fogo esteja municiada e porque é um crime de mera conduta, não exigindo qualquer evento naturalístico
para sua concreção. Este é o entendimento esposado pelo Colendo Supremo Tribunal Federal e secundado pelo Colendo
Superior Tribunal de Justiça: Para a configuração do delito de porte ilegal de arma de fogo é irrelevante o fato de a arma
encontrar-se desmuniciada e de o agente não ter a pronta disponibilidade de munição. Com base nesse entendimento, a Turma
desproveu recurso ordinário em habeas corpus interposto por condenado pela prática do crime de porte ilegal de arma de fogo
(Lei 9.437/97, art. 10), no qual se alegava a atipicidade do porte de revólver desmuniciado ante a ausência de lesão ao bem
jurídico penalmente protegido. Assentou-se que a objetividade jurídica da norma penal transcende a mera proteção da
incolumidade pessoal para alcançar a tutela da liberdade individual e do corpo social como um todo, asseguradas ambas pelo
incremento dos níveis de segurança coletiva que a lei propicia. Enfatizou-se, destarte, que se mostraria irrelevante, no caso,
cogitar-se da eficácia da arma para configuração do tipo penal em comento isto é, se ela estaria, ou não, municiada ou se a
munição estaria, ou não, ao alcance das mãos , porque a hipótese seria de crime de perigo abstrato para cuja caracterização
desimporta o resultado concreto da açãoRHC 90197/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 9.6.2009 (RHC-90197).AGRAVO
REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. ATIPICIDADE. ARMA DESMUNICIADA.
IRRELEVÂNCIA. ABOLITIO CRIMINIS TEMPORALIS. INOCORRÊNCIA. AGRAVO IMPROVIDO. 1. O desmuniciamento da arma
não conduz à atipicidade da conduta, bastando, como basta, para a caracterização do delito, o porte de arma de fogo sem
autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. 2. A hipótese de abolitio criminis temporária deferida nos
artigos 30 e 32 da Lei nº 10.826/2003 não contemplou o porte ilegal de arma de fogo, mas tão-somente o crime de posse. 3.
Agravo regimental improvido (STJ 6ª Turma - AgRg no REsp 763840 / RN rel. Min. Hamilton Carvalhido j. 26/04/2007, v.u. - DJ
25.06.2007 p. 313RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PENAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO
RESTRITO. ART. 14 DA LEI N.º 10.826/03 (ESTATUTO DO DESARMAMENTO). TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.
ATIPICIDADE. INEXISTÊNCIA. DESNECESSIDADE DE A ARMA ESTAR MUNICIADA PARA CARACTERIZAR CRIME DE
PORTE ILEGAL. PRECEDENTES DESTA CORTE SUPERIOR. 1. Para a configuração do delito previsto no art. 14 da Lei n.º
10.826/03, basta que o agente porte a arma de fogo sem autorização ou em desacordo com a determinação legal, o que torna
irrelevante o fato de a arma encontrar-se desmuniciada. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 2. Recurso desprovido
(STJ 5ª Turma - RHC 20136 / SC rel. Min. Laurita Vaz j. 10/10/2006, v.u. - DJ 13.11.2006 p. 275). Destarte, a condenação do
acusado é medida que se impõe. Todavia, o pedido de condenação formulado pela ilustre representante do Ministério Público
não pode ser acolhido na íntegra porque o agente, quando preso em flagrante na posse lato sensu de arma de fogo e munições,
responde por um crime único e não por dois delitos diversos, seja em concurso material, seja em concurso formal. Isto ocorre
porque há uma única ação criminosa provocadora de um único evento lesivo de somente um único bem jurídico tutelado
penalmente. Neste sentido:HABEAS CORPUS. PACIENTE PRESO EM FLAGRANTE NA POSSE DE MUNIÇÃO DE USO
RESTRITO E DE ARMA DE FOGO COM O SINAL DE IDENTIFICAÇÃO RASPADO. CONCURSO MATERIAL. BIS IN IDEM.
OCORRÊNCIA. CONFIGURAÇÃO DE CRIME ÚNICO. PRECEDENTES DA 5ª TURMA DO STJ. PARECER DO MPF PELA
DENEGAÇÃO DA ORDEM. ORDEM CONCEDIDA, NO ENTANTO, TÃO-SOMENTE PARA RECONHECER A EXISTÊNCIA DE
CRIME ÚNICO E FIXAR A PENA DO PACIENTE EM 3 ANOS DE RECLUSÃO E 10 DIAS MULTA, EM REGIME INICIAL ABERTO.
1. Segundo a jurisprudência desta Quinta Turma, o crime de porte de mais de uma arma de fogo, acessório ou munição não
configura concurso formal ou material, mas crime único, se no mesmo contexto, porque há uma única ação, com lesão de um
único bem jurídico, a segurança coletiva. 2. Ordem concedida, tão-somente para reconhecer a existência de crime único na
hipótese e fixar a pena do paciente em 3 anos de reclusão e 10 dias multa, em regime inicial aberto (STJ 5ª Turma HC nº
106.233/SP rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho - julgado em 18.06.2009 - concederam a ordem, v.u.).Assim, o réu deve ser
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º